RecordTV presta desserviço ao cristianismo com a novela “Jesus”
Cena do regresso de José e Maria para Nazaré onde reencontram Ana e Joaquim - Foto: Reprodução
Eu tive que voltar a cena para assistir de novo porque eu me recusei no primeiro momento a crer que Jesus tem dois irmãos na novela homônima da RecordTV. Todos os dias eu gravo para depois assistir apenas às cenas relacionadas a Maria (Juliana Xavier), José (Guilherme Dellorto) e ao próprio Jesus.
Assistindo hoje ao capítulo 08, exibido na quinta-feira, dia 02 de agosto, a trama assinada por Paula Richard (que conheci em 2006 em razão da Maratona de Roteiros promovida pela Associação de Roteiristas no Rio de Janeiro) apresentou a Sagrada Família (Jesus, Maria e José) quatro anos após a fuga para o Egito com algo peculiar à cristandade: a família tinha aumentado, além dos tradicionais personagens haviam dois garotinhos que eram filhos do casal.
Há trechos nos evangelhos canônicos em que se fala sobre os irmãos de Jesus (cf. Marcos 6,3 e Mateus 13, 55-56). Mas, nas línguas hebraica e aramaica não existe um termo apropriado para indicar os primos, e os designam com a mesma palavra que significa irmãos no verdadeiro sentido.
Tudo bem que o Protestantismo não considera a virgindade perpétua de Maria, mas levar a história por esse lado não pega bem. A emissora que há anos tem a audácia de acreditar que um dia será a líder de audiência acaba virando, mais uma vez, piada!
José e Tiago, irmãos de Jesus na novela - Foto: Reprodução
Ainda no capítulo 08, avisado pelo Arcanjo Gabriel (Raphael Sander), José diz à esposa que é chegada a hora de regressarem para casa pois aqueles que desejavam a morte do Messias não ofereciam mais perigo, já que estavam todos mortos.
Quando chegam à casa de Joaquim (Maurício Mattar) e Ana (Talita Castro), pais de Maria, é revelado o nome dos “irmãos” de Jesus: Tiago e José (como o pai). Eu quase dei um pulo do sofá! E nos próximos capítulos a prole vai aumentar!
A autora já havia cometido um erro gigantesco por ter criado uma irmã para Maria, a invejosa e chata Sula (Isadora Cecatto). Como se sabe, segundo a tradição cristã, conforme nos diz os evangelhos apócrifos (que não estão na Bíblia), os pais de Maria a tiveram em idade avançada e não tiveram mais filhos. Toda a história dos avós maternos de Jesus é muito presente em minha vida porque cresci na paróquia que tem os dois como padroeiros, e foi lá que posso dizer que me fiz um escritor e roteirista porque escrevi, dirigi e produzi inúmeras vezes peças de teatro para serem apresentados no dia em que se celebra a memória dos dois (26 de julho).
Não posso acreditar que Paula Richard não tenha feito a lição de casa bem feita para escrever essa novela. Não é possível que a emissora esteja tão despreocupada em contar uma história que não é tida como verdadeira. Tudo bem que não se tem provas concretas de que Joaquim e Ana não tenham tido mais filhos, e que o próprio casal José e Maria também não, mas não se pode desconsiderar tão desrespeitosamente a tradição cristã.
O lindinho ator que dá vida ao menino Jesus. O garoto lembra o ator Dudu Azevedo que dará vida ao personagem-título da novela - Foto: Reprodução
Quanto tempo tem de criação a Igreja Universal do Reino de Deus, igreja fundada pelo mesmo dono da emissora? Essa religião tem apenas 41 anos! Como se desconsidera uma história contada há mais de 2 mil anos em que se acredita que Maria e José não tiveram mais filhos, e nem que Ana e Joaquim conceberam tios para o Salvador?
Se a autora e sua equipe consideraram os nomes de Ana e Joaquim na criação da sinopse, por que não consideraram a história que se acredita? Será que Edir Macedo acredita mesmo que poderá com suas novelas proselitistas acabar com a Igreja Católica?
Como pode algum protestante (evangélico) não ter a mínima vontade de estudar a história do Cristianismo, saber as origens de tudo, de como é que aconteceu todos os desdobramentos e separações das igrejas cristãs? Como aceitar tudo garganta abaixo dos pastores que muitas vezes fazem um cursinho de meses para liderarem suas igrejas?
A novela “Jesus” só pode ser vista e tida como ficção mesmo. A RecordTV perdeu a oportunidade de conquistar telespectadores que não são de igrejas pentecostais ou neopentecostais, de contar uma história bonita.
Eu mesmo confesso que já perdi a vontade de continuar acompanhando a novela. Infelizmente Paula Richard cometeu um “grande pecado” em desconsiderar dados tão importantes. Não dá para combater uma religião que tem 2 mil anos com um texto que só agrada aos interesses do dono da emissora que é o líder religioso da Igreja Universal.
Nem vou manifestar minhas impressões quanto à cenografia, fotografia, trilha sonora e muito menos a sofrível interpretação de alguns atores. Vou ficar com a imagem de uma Maria qualquer de uma novela mexicana. A história dessa Maria e desse Jesus não é a história que é recontada há mais de 2 mil anos! Dois mil anos! Não é a história que a maioria das pessoas de todo mundo acreditam!
“O que não tem a gente inventa”, disse a autora em entrevista que você pode encontrar em diversos sites. Por favor, Paulinha! Invente, mas não crie bobeiras! Não crie coisas que são tidas para a maioria (católica, de onde a Igreja Universal e qualquer outra religião cristã tem sua origem) como se fossem a verdade. A novela é patética!