O grito de socorro do Cerrado brasileiro
Por Márcia Cristiane Kravetz Andrade
Um dos biomas do país, o Cerrado, abrange cerca de 25% do território brasileiro. É uma região de ampla biodiversidade, com mais de 6 mil espécies de árvores e 800 espécies de aves. Com um papel extremamente importante na formação de nascentes de rios, o Cerrado contribui com aproximadamente 40% da água doce do país. Porém, o bioma tem enfrentado um aumento alarmante de 44% de desmatamento, atingindo uma área de 7.852 km², segundo dados do sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Essa situação representa o maior índice de desmatamento desde o início do monitoramento, em 2018, ameaçando a biodiversidade e a oferta de água do país.
Alvo de expansão agropecuária (atividades agrícolas, pecuárias e silviculturas), o Cerrado enfrenta o desmatamento para a abertura de novas áreas para essas atividades, levando a preocupações ambientais e planos de conservação. Essa destruição pode comprometer o aumento das emissões de carbono para a atmosfera, perdas de solo por erosão, como consequência o assoreamento de corpos hídricos, afetando a capacidade do bioma em reter água, podendo resultar em escassez hídrica. Isso é um fator problemático em um país dependente da água, não apenas para a segurança alimentar, mas também para a segurança energética.
Se observarmos a tecnologia e as práticas agrícolas sustentáveis, juntamente com uma utilização mais eficiente das culturas já estabelecidas, entre elas a agricultura familiar, assegura-nos uma produção agrícola segura, sem a necessidade de comprometer a preservação ambiental. Uma pesquisa do Fundo Mundial Para a Natureza (WWF) aponta que o Brasil já possui áreas disponíveis para atender à produção até 2050, sem a necessidade de mais desmatamento.
O desmatamento no Cerrado, conforme o Código Florestal reformulado em 2012, possui uma parcela legal, mas muitas autorizações formais para a remoção da vegetação são irregulares, não seguindo critérios necessários. A falta de conformidade torna muitas ações legais consideradas ilegais. A precisão das informações sobre autorizações de desmatamento pelos Estados é questionada pelo governo federal, destacando a necessidade de envolvimento dos governos locais e empresas agrícolas em práticas sustentáveis.
De 2012 para cá, muitas coisas mudaram, o cenário ambiental nacional e mundial mudou. Temos os ODS a cumprir até 2030, a mudança climática e desastres naturais estão ocorrendo. Então não seria a hora de rever novamente o Código Florestal e as demais legislações cabíveis, e determinar parâmetros legais e ambientais? Ou essas reformulações são pautadas muito mais em interesses unilaterais de determinados setores econômicos? E o artigo 225 da Constituição Federal não precisa ser levado a sério? Assim como as ações e engajamento para diminuir o desmatamento na Amazônia tem se tornado diário e divulgado mundialmente, é necessário um engajamento no Cerrado, ou o desmatamento irá passar de bioma em bioma, e só depois de dados alarmantes o governo irá se preocupar?
É essencial que o governo federal, estadual e municipal, reconheça a importância de seus recursos naturais, implementando uma abordagem multifuncional, envolvendo estratégias como o aumento da produtividade em áreas já estabelecidas, como a diversificação da produção e o fortalecimento da agricultura familiar, além da promoção de sistemas agroflorestais, remuneração por serviços ambientais e práticas sustentáveis. Precisamos de uma abordagem mais integrada e sustentável para enfrentar o desmatamento no Cerrado brasileiro, e quem sabe um plano de controle para desmatamento e problemas ambientais possíveis, para cada bioma não seria o ideal.
(*) Márcia Cristiane Kravetz Andrade é Mestre em Ciência e Tecnologia Ambiental, Doutoranda em Sustentabilidade Ambiental Urbana e Tutora dos cursos de Pós-Graduação na Área de Meio Ambiente da UNINTER.